Paulo Figueiredo: ‘Nunca fui notificado’, diz último denunciado por golpe 4aa6p
Analista político com 500 mil seguidores, neto do ex-ditador João Figueiredo é integrante do único núcleo cuja denúncia não foi analisada pelo STF 5q4p49

O processo da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF) tem cinco núcleos, divididos de acordo com a participação de cada denunciado. Dentre todos eles, somente o quinto, com um único integrante, ainda não teve o recebimento da denúncia analisado nem tem prazo para isso. O comentarista político Paulo Figueiredo, neto do último ditador brasileiro, João Baptista Figueiredo (que governou o país de 1979 a 1985), é a peça que falta para o andamento da Justiça na Suprema Corte, como mostra reportagem de VEJA na edição desta semana.
Paulo Figueiredo é acusado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, de colaborar em um plano para pressionar chefes militares a aderirem ao movimento de quebra da ordem democrática em gestação no final de 2022, com a divulgação de uma carta escrita pelo grupo que planejava a trama. Segundo a PGR, Figueiredo “instrumentalizou a sua condição de comunicador para provocar a cooptação do Alto Comando do Exército ao movimento golpista”. Além disso, o ex-comentarista da Jovem Pan foi denunciado por espalhar fake news sobre as urnas eletrônicas, produzidas pelo argentino Fernando Cerimedo, insinuando que o resultado eleitoral de 2022 havia sido fraudado.
Nas últimas semanas, Figueiredo, que possui cidadania americana, tem sido fundamental nas articulações que visam levar o governo de Donald Trump a sancionar o ministro Alexandre de Moraes. Em entrevista a VEJA, ele disse que vive, há dez anos, na cidade de Weston, a 50 quilômetros do condado de Miami-Dade, na Flórida, com a mulher e duas filhas, de dez e nove anos, todas americanas. De lá, ele fazia entradas ao vivo na programação da Jovem Pan, como comentarista político, até 2023. É também de onde atualmente transmite seu programa diário, “Paulo Figueiredo Show”, no YouTube, no qual comenta o cotidiano político brasileiro para meio milhão de seguidores.
Seus apoiadores podem pagar mensalmente por seu conteúdo, partindo de 6,99 dólares (cerca de 50 reais) e chegando a 49,99 dólares (cerca de 330 reais). Além disso, Figueiredo disse para a reportagem que possui diversos outros negócios, como a empresa de imigração Immigrex e outros de ramos variados, como varejo, mas que não revela por medo de retaliação judicial e política.
Leia a entrevista exclusiva abaixo: 75it
Como é ser o único integrante do núcleo cinco do processo no STF que trata de uma suposta trama golpista no Brasil? Eu nunca fui notificado efetivamente sobre essa ação penal. Tudo o que eu sei sobre ela é o que saiu na imprensa. Pelo que eu entendi, as condutas atribuídas a mim são, basicamente, crimes de reportagem. Eles atribuem a mim a publicação de uma carta que circulava entre os militares. E a carta era verdadeira. E eles veem, parece, dois militares conversando sobre isso. É óbvio que, antes de falar da existência de uma carta, a gente checa com múltiplas fontes. E essas fontes tinham que estar dentro das Forças Armadas ou, caso contrário, elas não seriam fontes. Então, eu reportei sobre uma carta que existia. E a outra coisa que eles falam é que eu reportei sobre um clima de divisão, o posicionamento de determinados oficiais generais e a divisão que existia dentro do Alto Comando. Essa divisão se comprovou. Então, tudo que eu reportei era verídico. Fora isso, eles tinham o aos meus diálogos com o ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, nos quais eu chamo os atos do 8 de Janeiro de estúpidos, e peço para Bolsonaro se manifestar contra isso. Eles tinham o a isso e optaram por ocultar essas provas de forma criminosa até que a defesa dos demais réus pediu o o integral às mídias, e isso acabou vazando para a imprensa. Então, sobre a matéria [judicial], é a criminalização da profissão de jornalista.
A leitura da PGR, na denúncia é a de que você teria influência sobre os militares, então divulgar essa carta teria um sentido de tentar influenciá-los. Como avalia isso? Imagine se todos os jornalistas que são influentes arem a ser responsabilizados pelo que o público faz com o que eles publicam. Então, por exemplo, a revista VEJA é muito influente no Brasil. Ela publicou uma capa, na semana ada, com o deputado Eduardo Bolsonaro. O Moraes pode dizer que, como é muito influente e o Eduardo está sendo investigado por ações criminosas nos Estados Unidos, essa revista está influenciando as pessoas em favor do deputado. Ou seja, é a criminalização mesmo da profissão de jornalista.
O senhor disse que nunca foi intimado a depor. Se for intimado, pretende fazê-lo? Eu já respondi a outros processos, moro no mesmo lugar há mais de dez anos. Eu já respondi a processo [do Brasil] aqui nos Estados Unidos, compareci ao consulado, inclusive, como medida cautelar, declarando o meu endereço. Respondo a outro processo no Brasil, na Justiça do Rio de Janeiro. Então é de conhecimento da Justiça o meu paradeiro. O que o Moraes fez foi tentar se evadir, mais uma vez, do processo, da jurisdição americana, para me notificar de acordo com os tratados internacionais, que regem notificação criminal entre os dois países. Inclusive, a segunda parte da carta do Departamento de Justiça [revelada pelo The New York Times recentemente], é a respeito de como a cooperação internacional em assuntos criminais tem que ser feita entre os dois países. Então, o Moraes está dando um jeitinho para tentar não me intimar. E eles já criaram o núcleo 5, me deixaram sozinhos, porque eles sabiam disso. Eu estou à disposição da Justiça.
“Eu nunca fui notificado efetivamente sobre essa ação penal. Tudo o que eu sei sobre ela é o que saiu na imprensa. Pelo que eu entendi, as condutas atribuídas a mim são, basicamente, crimes de reportagem”
E sobre a acusação de que ajudou a espalhar a fake news sobre urna eletrônica? Até hoje, os questionamentos que foram feitos pelo Fernando Cerimedo não foram explicados pelo TSE. E o papel de agentes públicos é responder a todas e quaisquer dúvidas que a sociedade apresente. E é por isso que quase metade da população brasileira não confia no próprio sistema, que é o alicerce da democracia.
Tem algum tipo de contato hoje com o ex-presidente Jair Bolsonaro? Eu posso responder apenas por mim. Bolsonaro não fala comigo. Eu sou bloqueado no WhatsApp dele, em respeito que ele tem à medida cautelar que proíbe a comunicação entre corréus.
Como vê a investigação aberta contra Eduardo Bolsonaro por ele ter feito basicamente o que senhor também faz, que é pressionar autoridades americanas a aplicar sanções a autoridades brasileiras? Eu vejo como um agravamento da situação autoritária do Brasil. A criminalização de um parlamentar conversar com outros agentes públicos. O Eduardo Bolsonaro não tem nenhum poder de ação aqui nos Estados Unidos. Então, se ele [Moraes] está dizendo que a atividade do Eduardo é criminosa, ele, na verdade, está criminalizando a atuação do próprio governo americano. E é por essas e outras que ele vai ser sancionado.
O senhor afirmou em uma edição do “Paulo Figueiredo Show” que seu objetivo era “pegar o Moraes”, mas que os outros ministros do STF poderiam ser afetados se respondessem contra eventuais medidas dos EUA. Acha possível fazê-los sancionar todo o Supremo? O que a gente pode fazer é fornecer informações e opiniões para agentes do governo americano. Nós, aqui, não somos ninguém. O Eduardo é um deputado licenciado, e eu sou um imigrante jornalista. Só que somos respeitados. Então, por isso, a nossa opinião e as informações que trazemos, todas elas consubstanciadas — tudo nos Estados Unidos é feito com muito critério, tudo precisa de documento –, são levadas em conta. Nesse primeiro momento, o alvo é Moraes, porque se entende que ele é o grande violador dos direitos humanos no Brasil, quem mais vilipendia a democracia no Brasil. Agora, todos os outros que quiserem entrar em defesa dele am a ser seus apoiadores. E a legislação americana é clara: ela fala dos violadores de direitos humanos ou daqueles que lhes dão apoio, aqueles que são seus cúmplices.
Como as articulações com o governo americano foram iniciadas? Começou no final de 2022, quando eu identifiquei que havia pouca saída institucional para o Brasil e que a esquerda tinha utilizado dos Estados Unidos para influir no processo eleitoral brasileiro. E eu fui buscar um antídoto para que os americanos assem a influir positivamente para a restauração das liberdades no Brasil, como eles historicamente fizeram. E, ao longo desse processo, eu sentei com 43 membros do parlamento dos Estados Unidos, entre senadores e deputados. Em 2024, nós conseguimos realizar uma audiência pública sobre o Brasil. Participaram o CEO do Rumble, Chris Pavlovski, e o [jornalista americano] Michael Schellenberger, que foi alvo direto de ações do Moraes. Fora isso, foram centenas de entrevistas. Eu fui em, praticamente, todos os grandes podcasts americanos. O Eduardo também. Fizemos uma divisão. Eu fui na PragerU, ele foi no Jordan Peterson, no Steven Crowder eu fui várias vezes. Os dois fomos no Tucker Carlson. Nós dois vivemos na televisão americana, no One America News, Newsmax, o programa do Steve Bannon, para tentar conscientizar os americanos do que estava acontecendo no Brasil. Em 2022, ninguém nem sabia quem era Alexandre Moraes aqui. Era tudo muito difícil. E essa articulação surtiu efeitos. Quando Donald Trump se tornou presidente, muitas das pessoas com quem a gente tinha construído relacionamento foram para a Casa Branca. Algumas das pessoas com quem eu já tinha relacionamento há mais tempo, o próprio Jason Miller, que é um amigo pessoal e um dos principais conselheiros do Trump. Então, a gente se aproveitou disso para conseguir explicitar melhor o que estava acontecendo.