‘Não fui criada para estar em batalhas fáceis’, diz Rachel Maia 1u394k
Conselheira da Vale e ex-CEO da Tiffany, empresária fala à coluna GENTE do seu olhar sobre sustentabilidade e racismo e por que joga golfe com poderosos 5c5h6d

Aos 54 anos, Rachel Maia é empresária e conselheira istrativa de empresas como Vale, GPA e Pacto Global ONU, além de fundadora e CEO da RM Cia 360, focada em impacto social e ambiental. Seu vastíssimo currículo ainda traz o cargo que ocupou como CEO da Lacoste e da Tiffany no Brasil. Numa sociedade ainda tão desigual como a brasileira, Rachel é pioneira em diversos aspectos. “O maior desafio é ser uma mulher preta”, diz. Em conversa com a coluna GENTE, durante o Desert Women Summit, realizado entre 23 e 28 de maio em Erfoud, no Marrocos, Rachel fala sobre os desafios da sustentabilidade, assunto que vai tratar na COP30, em novembro, além de trazer relatos e experiências de sua trajetória inspiradora. Confira.
JOGANDO GOLFE. “Ter conhecimento não basta para transformar. É a mesma coisa de racista. ‘Eu não sou racista. Ah, mas eu nunca fiz nenhuma ação inclusiva’. Não basta ser racista, tem que ser antirracista com ações. Um dos lugares que adoro estar é no golfe. Por que eu jogo golfe? Porque os investidores que decidem algo jogam golfe. ‘Ah, meu Deus, mas você vai lá jogar golfe? Você não sabe jogar’. Não, mas aprendo. Estou lá aprendendo. Estou lá com o (empresário) Roberto Almeida. Estou lá com o Rui Parizotto. Estou lá com a galera que faz a coisa acontecer”.
PESO DA TRAJETÓRIA. “Quando penso nesse peso, penso na minha mãe. Ela tinha esse peso na geração dela. Minha mãe era muito interessante, fazia reuniões com as mulheres lá em casa para vender tupperware, vender Avon… uma forma de empreender. E nós assistimos a isso, cinco mulheres dentro de casa. Minha mãe incomodava, porque instigava outras mulheres a ter renda para não precisar do marido para comprar sua calcinha. Isso é importante. Então, sim, tenho essa consciência que incomoda. Mas eu vou ficar pensando no incômodo ou na geração que eu gostaria de preparar de uma forma mais autônoma, e ao mesmo tempo inclusiva? Quero ajudar a preparar essa próxima geração a transformação da próxima geração”.
VAI DAR ROCK. “Sou uma pessoa apaixonada pela vida, otimista por natureza. Quero acreditar que vai dar rock aqui, sabe? Na próxima fase, quero acreditar que meu filho ou teu filho vai olhar para o próximo e não julgá-lo simplesmente pelo gênero, pela raça ou pela condição física ou pela orientação e assim por diante.
MAIOR DESAFIO PROFISSIONAL. “O maior desafio é ser uma mulher preta. Esse é o meu grande desafio de vida, porque não foi ser uma mulher preta que me colocou onde estou. Tive que ser melhor do que algumas pessoas com as quais já concorri. O desafio é ser a única, ser a precursora. Vejo que ei pela arrebentação e eles me aceitam. Os grandes investidores, os grandes formadores de opinião”.
O MAIOR ABSURDO QUE JÁ OUVIU. “‘Rachel, você é presidente, não precisa se sentir mais preta’. Ou… ‘Essa é a fila de VIP, da first class, a senhora está na fila errada’. Aí uma pessoa atrás de mim falou assim: ‘É a Rachel Maia, você não estava reconhecendo? Ela pode’. Para casos assim, a minha postura depende do dia, porque eu sou humana. Tem dias que estou com vontade de batalha, tem dias que olho e falo: ‘cara, você não merece’”.
PRECONCEITOS. “O ser humano, nessa arrogância e soberba, às vezes, de julgar pelo estereótipo, é uma coisa ingrata, E ainda com a cultura que foi por muito tempo excludente. Mas não quero falar disso, sobre isso, para isto. Quero que, quando você julgar, lembre-se que está falando com outro ser humano. Quero que o consumidor possa entrar numa loja e, independentemente do fenótipo, ser bem tratado (…). Minha mãe podia ter me criado para ser uma pessoa que estivesse em batalhas mais fáceis, mas não fui essa pessoa. E faz parte. Sinto prazer”.
AGEM PELA TIFFANY. “Fui itida na Tiffany, quando nem existia a palavra ‘diversidade’. Éramos um total de sete candidatos. Dos sete, fui a melhor. Fui itida porque soube responder quando Mr. Warren Felt, CFO Global na época, perguntou a todos: ‘let me know what’s going on in the world’ (O que está acontecendo no mundo?). Sabia o que estava acontecendo no mundo, porque o meu pai falava: ‘leia jornal, que seja velho, mas leia jornal e assista a tudo para saber das notícias’. Eu sabia o que estava acontecendo na arte, na Telecom, na Tyco Healthcare, com o sequestro das obras do Pablo Picasso. Fui itida porque fui a melhor. Simples assim. Fiquei quase oito anos lá”.
O OLHAR DO OUTRO. “Jamais o fato de ser negra foi uma trava ou bloqueio ou motivo de falar: ‘acho que não vou ali não, porque ali está o top do top da nata’. Às vezes existe esse estranhamento, porque faz parte dos vieses inconscientes de uma sociedade excludente. Mas vejo a necessidade de a gente fazer a transformação ainda pelo positivo. Posso falar de tudo pelo simples fato de ser eu. As pessoas já vão me olhar. É uma mulher preta. ‘Deixa eu ver o que ela está falando’. Porque não é o normal. Sabe? Foge do padrão normal”.
PRESENÇA EM CONSELHOS. “Concorri nas preferenciais do conselho da Eletrobras, mas perdi. A votação ficou Pedro Batista com 63 milhões e eu com 52 milhões. Se tivéssemos a mesma legislação de outros países, que contam as abstenções e as contras, eu teria entrado. Continuo no conselho da Vale e no Pacto Global da ONU. Foco agora na Cop30, estaremos todos em Belém, trabalhando junto com André Corrêa do Lago (diplomata e atual secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores; e presidente da COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima)”.
SENTIMENTO COM COP30. “Nós precisamos ser otimistas. Agora, quanto aos resultados, vamos ver quão séria será a rodada. Porque a rodada da parte dos estados, dos governos, vai ser 6 e 7 de novembro. Essa rodada vai ser fundamental para definir se a COP das Florestas, de fato, vem para deixar claro que impacto ambiental e social, mudanças climáticas e transição energética não são temas somente aqui do cone-sul do mundo. É tema global. A COP chancela a seriedade na temática. Que seja uma COP que una países em desenvolvimento com países desenvolvidos. A mudança climática não difere países desenvolvidos dos em desenvolvimento. A mudança climática é uma para o mundo todo. A transição energética é uma para o mundo”.
CONSUMO CONSCIENTE. “Cada vez mais as empresas devem ter responsabilidade nas suas produções, na forma de produzir, na forma de cultivar, e isso tudo o consumidor antes não prestava atenção. Hoje ele vem aqui e olha o rótulo, qual é a composição do produto… O reflexo é que o produto ainda não é tão ível, mas em todos os meios temos como trazer a demanda de sustentabilidade, de um produto cada vez mais sustentável”.